Já trouxe algumas explicações técnicas, contei sobre algumas
decisões lá de casa, dei dicas de aparelhagem, neurologista, lojas, e tudo que
sei pertinente a cada assunto tratado. Ótimo, parece que consegui ajudar, fico
muito feliz, mas isso tudo está longe de ser o "tudo" que precisamos
saber, ou do que vivemos em casa com a AMS. As consequências dela são doloridas
demais, não apenas para o portador da doença, mas para seus filhos, irmãos,
companheiros, primos, sobrinhos, pais e amigos. É sobre isso que me proponho a
falar agora: Sobre como é para mim.
Acho que será a postagem mais difícil de
escrever...
A proposta não é outra senão
servir para dar um empurrão, uma chacoalhada para aqueles momentos de terror,
como as histórias de muitos de vocês já são para mim.
Não tem um dia sequer que eu não odeie
essa doença. O fato de ela trazer um aprendizado não me faz gostar dela nem
pouquinho. Eu preferiria aprender muitas coisas de outra forma, ou até mesmo
ficar na ignorância, porque com tudo que ela pode trazer de bom - e olha que é
preciso muita força de vontade e uma dose de criatividade para ver esse lado
bom - eu odeio ver a minha mãe doente assim. Odeio!! Pronto, falei!
Minha mãe não é só a minha mãe. É um dos
personagens principais de todos
os sonhos que já tive na
minha vida. No meu casamento não era eu e meu noivo que ocupávamos o cenário
principal. Era a minha mãe lá na frente me dando um sorriso que só eu
entenderia. Ela sempre coube em tudo na minha vida. Me via em seu apartamento nos finais de semana - claro, no mesmo prédio que o meu. Quando pensava em filhos já via a cena da avó sensacional, que poderia finalmente
fazer pelos netos o que fez pelas milhares de crianças que passaram pelas suas
mãos, quando exercia a atividade de coordenadora pedagógica e educacional. Minha
mãe sempre esteve em todos os cenários, todos os meus sonhos, no meu futuro sem
fim. Já vivi nosso Natal do ano de 2020. Mentalmente levava ela e todas as amigas para a mega feira de artesanato, e faria uma surpresa levando-as para tomar um café enquanto as crianças estariam no inglês. Já sonhei tanto... e ela estava em todos esses sonhos.
Temos uma vida juntas. Fizemos hidro, cursos de culinária,
maquiagens, feng shui. Estudamos juntas no centro espírita, como colegas de
sala, lado a lado. Almoçávamos fora de final de semana, viajávamos
nas férias, comprávamos coisas escondidas do meu pai... Cortávamos os cabelos
no mesmo lugar, saíamos para compras de roupa, de casa, de natal, de tudo. Sempre foi a
primeira a saber dos meus problemas, a me incentivar para tudo que eu
quisesse fazer. Incrivelmente fez e foi tudo isso sem deixar de ser mãe. Não virou minha "amiguinha". Nunca
levei na lancheira biscoito ou salgadinho. Tinha lanche feito no dia, as 6h da manhã. Jamais deixei de levar uma bronca se
aparecia um lápis que não fosse meu dentro do meu estojo. Ela sabia tudo o que
eu tinha, fazia todas as lições de casa comigo, e deixava que eu assistisse na TV
ao programa de minha preferência. Escolhia as férias divertidas para os filhos,
ainda que custasse deixar o marido em casa e ir sozinha com os dois debaixo do braço. Saía do trabalho as 19h30 e se eu
precisasse passar em algum lugar ela me levava feliz.
É dela quem eu cuido hoje. Da única pessoa
que me ama me aceitando como eu sou. Cuido do grande amor da minha vida, a quem amo incondicionalmente. Sendo
assim, como eu consigo não estar revoltada ou deprimida? Vários são os motivos.
O primeiro é porque certamente devo estar
recebendo muita ajuda do "Alto". Anjos, protetores, guias, qualquer
que seja o nome dessa turma, eles estão trabalhando bastante. O outro motivo é
que não é hora de parar. Acredito que meu mental entende tanto isso que ajuda
meu corpo a funcionar direito. Ela precisa de mim inteira. O último motivo, o
único que não depende de qualquer esforço, é o AMOR.
Na mesma proporção que lembrar a doença me
traz uma dor desesperadora, a cada momento que olho para a minha mãe sinto um
amor imenso, tão grandioso, que me traz toda a força para continuar. Eu choro
várias vezes por semana, sinto muito medo da minha vida solitária sem a
presença física dela, me sinto exausta, às vezes sem forças para dirigir. Rezo
para que ela durma a noite inteira, assim durmo também. Às vezes torço para ela
não querer sair, ou que queira só tomar um solzinho lá em baixo, quando estou bem cansada, mas basta eu
chegar em casa e vê-la que tudo passa. Só penso que ela depende da boa vontade
dos outros para simplesmente se ajeitar na cadeira, mudar o canal da TV ou
tomar um gole de água. Quero fazer tudo para que se sinta bem. A força
vem, porque amo cada dia que tenho ela na minha vida.Tudo fica fácil, faço sem pensar, e quando vejo estou insistindo para dar uma "voltinha" pelo Sams Club.
Não tem mês
que vem para nós, só tem o dia seguinte, que começa só
depois das 18h. Antes disso ainda estamos vivendo o hoje. Cansamos demais, não vendo a hora de chegar a noite para dar uma descansada. É assim que eu vivo. Tenho um
objetivo maior que ter a minha casa, meu marido ou meus filhos. É ela. De vez
em quando busco uma força extra num dia gostoso com um amigo amado, num passeio
de meninas com uma amiga, ou num simples almoço feliz, mas sei que daria para
conciliar outras coisas se eu quisesse, ou talvez se fosse mais organizada.
Tudo bem, me permito ter um cansaço mental, não pensar em outras coisas, e
viver assim.
Sinto não ter mais o que tive, e sinto
mais ainda não poder realizar com ela tantos sonhos que sonhei, mas ela fez algo
muito melhor. Construiu uma Regina em mim. Vejo milhares de coisas dela nas
minhas atitudes, escolhas, afagos e afetos. Aprendi seu tempero, conheci suas
amigas, amo seus amores. Soube até ajudar na escolha da escola da minha
afilhada. Ouvia a voz dela conversando sobre os itens importantes a serem
verificados antes de matricular a Bibi. Ela me deu o peixe enquanto pôde, mas
me ensinou a pescar.
Ela está comigo, vivenciando o nosso amor, cuidando de mim quando pede para a cuidadora me ligar para saber se minha dor de cabeça melhorou, ou se saí agasalhada. Ajuda a escolher minhas roupas, ri do meu humor e descansa seus braços em volta de mim todos os dias quando nos ajeito para um abraço. São essas coisas que me alimentam.
Com tudo, viveria assim outras tantas
vezes, outras tantas vidas se precisasse, só para tê-la como mãe.
Sou MUITO grata por ter me aceitado como
filha, e por ter confiado em mim para ajudar a cuidar de você. Que bom que cuidou tão bem de mim, me ensinando a retribuir um pouco agora.
Obrigada, amada.
O único comentário que tenho a fazer é simples ." Parabéns Anali por ser quem és e à sua mãe por ter de preparado para encarar esta luta da forma que esta fazendo "
ResponderExcluirConcordo com tudo o que falou , mas hoje , depois de algum tempo passado , eu sei que faria tudo o que fiz por mais 100 anos , e sinto falta de ter a Rosana aqui comigo , pois apesar de quase 8 anos de luta hoje eu me sinto só , não há um dia em que eu não a veja , ou pense nela .
Só posso desejar que você continue com a perseverança e dedicação que tem , pois é a única coisa que temos a fazer .
A minha maior preocupação além dos acompanhamentos médicos e terapêuticos foi dar-lhe "CONFORTO " que é o que nos satisfaz , saber que a pessoa que amamos esta bem atendida nas suas necessidades .
Um grande abraço , e onde eu puder lhe ajudar estrarei sempre à disposição .
Raphael, meu amigo... obrigada pelas suas palavras de força e apoio constantes. Sempre com a gente, né... obrigada. Que bom que pôde cuidar dela, que bom que nós podemos também. Perseverança sim, mas muito amor é o que me move. Abraço forte.
Excluircorreção " estarei sempre à disposição "
ResponderExcluirEssa sempre foi você, desde que a conheço, e olha que se a gnt contar faz um tempinho né?
ResponderExcluirParabéns por manter esta energia e este amor, tenho certeza que é ele que te faz ser forte.
Bjs, Glaucia.